Wednesday, June 29, 2011

Ócio VS Economia?


Ultimamente tenho notado que está na moda associar as férias a um dos factores que conduziram ou contribuíram para a crise económica global que vivemos.
Detesto empregar vocabulário do politiquês mas, isto sim, é demagogia e populismo. Desde quando isto é verdade?
Vejamos…


Oiço nas notícias que o novo governo português quer reduzir o número de feriados e de pontes para aumentar a produtividade dos trabalhadores portugueses. Ora, logo em Portugal? Um dos países em que este argumento menos sentido tem? Francamente… é literalmente morder a mão que os alimenta.
O ócio é o espaço reservado ao repouso e ao lazer. É o período em que as pessoas se dedicam a fazer o que lhes dá prazer e vontade. E o que é, geralmente, isso? Passear, viajar, ir ao teatro, compras, cinema, restaurantes, ler. Hum… mas, isso não move dinheiro? Ah, afinal sim! O turismo não é alimentado pelo ócio, afinal? Ah, sim!
Ponham as pessoas a trabalhar 20 horas por dia, sete dias por semana e verão a brilhante produtividade que irão obter ao fim de um ano. Ponham outra a trabalhar 6 horas por dia, durante cinco dias por semana e verão a produtividade dessa ao fim de um ano. Sabem que mais? A segunda terá uma produção menor, mas uma produtividade maior. Porque terá uma melhor relação “tempo dispendido vs objectivos alcançados”. Para a economia recuperar não é preciso trabalhar mais, mas sim fazê-lo melhor. E descansar é preciso e ainda por cima gera valor para alimentar a cadeia económica. Cria emprego, cria circulação de dinheiro e faz com que as pessoas tenham vontade de gastar.

O turismo é sempre apontado como uma das economias sobre as quais o futuro deverá girar. Mas é, ao mesmo tempo, fácil dizer que é dispensável porque parece cool e dá uma máscara de trabalhador a quem diz que cria improdutividade. Senhores, matem o turismo e matarão um dos eixos sobre os quais deveriam assentar o vosso futuro, garanto-vos!
Quando as pessoas querem uma ponte para ter um fim-de-semana longo querem viajar com as suas famílias. E o que fazem pela economia nesses períodos?
- Gastam dinheiro na viagem (quer seja em combustível, em passagens aéreas ou em aluguer de viaturas);
- Arrendam apartamentos ou quartos de hotel;
- como querem descansar e não cozinhar vão almoçar e jantar fora;
- compram recordações para a família;
- vão a bares e discotecas.
Tudo isto envolve dinheiro, não? Será que não alimenta a economia? Ah, pois é!

Se uma coisa a sociedade grega nos mostrou foi a utilidade e necessidade do ócio para o bem-estar dos cidadãos. O ócio faz bem às pessoas e à economia. Pessoas felizes e descansadas são melhores e maiores consumidores (quantidade e qualidade).
Produção maior não significa produtividade maior. Qualquer gestor tem obrigação de saber diferenciar estes conceitos. Quantidade não deve ser confundida com qualidade.

Não se deve matar a galinha que mais ovos nos dá…

Nesta “Guerra Santa” em nome da economia só me apraz terminar este artigo com uma citação de Milhôr Fernandes que dizia que:

“Numa Guerra Santa, Deus morre primeiro.”

Carlos Osvaldo

Monday, June 27, 2011

A verdade que tem que ser verdade.



Façamos um exercício de imaginação. Estamos na América do tempo dos cowboys e somos o xerife de uma das cidades mais importantes do país.
Um belo dia a nossa cidade é atacada. Saqueada, as mulheres violadas e os monumentos mais sagrados destruídos. O nosso inimigo consegue fugir. Todos sabemos quem é, mas ninguém sabe para onde foi.
Como xerifes somos, naturalmente, designados pelo mayor para abandonar tudo o que nos ocupava até essa altura. A missão, de agora em diante passa por capturar o inimigo, vivo ou morto.
E assim partimos... mochila às costas e montados no nosso cavalo.
Passam-se dias, semanas, meses, anos (1, 2, 3...). Sabemos que não podemos regressar à nossa cidade sem a missão cumprida. Esta é uma daquelas situações em que o tempo não adormece a memória das ferida abertas que ainda sangram.
Um belo dia descobrimos o inimigo. Morto. não sabemos se foi envenenado ou morreu de doença, ou ainda de causa natural. Mas está morto. Estamos perante o seu corpo.

Voltando para casa vamos de imediato reunir-nos com o mayor.
- Então, xerife, o nosso inimigo?
- Morto.
- Ah, bem sabia que não nos irias desiludir. Parabéns!
- Eu não o matei. Apanhei-o já morto.
- Sabes quem o matou? Ou como morreu?
- Não faço ideia. Mas está morto, disso tenho a certeza. Eu mesmo enterrei o seu corpo.
- Hum, pelo menos a ameaça acabaou. Podemos dar paz aos nossos cidadãos.
- É verdade. Acabou.
- Mas há um pormenor que faz toda a diferença; não foste tu que o mataste. Não fomos nós que eliminámos o inimigo. Isso faz toda a diferença para o nosso povo, em matéria de consolo e tranquilidade. Saber que foi um terceiro ou alguma doença ou a velhice que o mataram faz com que ele tenha morrido sem ser derrotado por nós. Não podemos deixá-lo morrer vencedor.
- O que sugere mayor?
- Vamos dizer que tu o mataste. Só assim o nosso povo terá confiança, paz e recuperará o orgulho perdido. Só assim saberão que quando nos propomos a algo cumprimos.
- Quer vender uma ilusão?
- Quero dar ao meu povo o que ele precisa.
- Mesmo que não seja a verdade?
- A verdade é aquilo em que a maioria acredita.

Somos apresentados como heróis. Homenageados e venerados. O segredo é engolido entre nós e o mayor. A verdade tem que ser verdade. O nosso povo precisa disso. Morremos por dentro. Vergonha, frustração. Sentimo-nos uma farsa. Mas é um fardo que temos que carregar para não quebrar ilusões que constroem uma nação.

Osama Bin Laden morreu. Facto. Se não fosse verdade não se correria este risco de poderem ser desmentidos. Mesmo que esteja em cativeiro em posse dos EUA é o mesmo que estar morto pois deixa de existir como símbolo.
Imaginem que Barack Obama tivesse anunciado que Osama Bin Laden fora encontrado morto. O trauma americano continuaria. Bin Laden morreria vencedor. Por isso deixa de ser relevante saber como aconteceu ou como morreu. A notícia deveria ser a sua morte. A verdade nem sempre deve ser usada no que diz respeito ao marketing e relações públicas. Obama não poderia anunciar ao seu país qualquer verdade. A notícia, para os americanos não era a sua morte, mas sim a vitória simbólica da América sobre o terrorista. Há momentos em que a obrigação fala mais alto que a vontade ou mesmo a realidade. Há coisas que devem ser feitas, mesmo que não sejam as mais belas ou simpáticas. Gerir um país obriga a pensar pelos olhos do povo. A sentir o que o povo sentirá com o que se vai anunciar.
Obama morreu. A notícia mais esperada pouco importa afinal. Os EUA mataram Bin Laden. “We got him!”. Essa foi a notícia percebida pelo povo Americano.
A História é feita destes episódios.
Obama morreu. Facto. Ponto final, parágrafo. Surdina? Rumores? Boatos? Suposições? Eu digo, distracções.

Carlos Osvaldo
Junho 2011